O Amor em Silêncio: Reflexões sobre a Linguagem Afetiva e a Expressividade Contida
Dolores FlorPublicado em 22 de Setembro de 2025 ás 15h 28min

A experiência amorosa, ao longo da tradição literária e filosófica, foi marcada por múltiplas formas de expressão, desde a eloquência dos grandes discursos até a delicadeza dos gestos mínimos. O amor não se limita ao excesso verbal: ele também se manifesta no silêncio e na economia de palavras. Nesse sentido, é possível compreender o fenômeno do “amor contido” como um modo legítimo de afetividade, que não se caracteriza pela ausência, mas pela intensidade implícita.
Há sujeitos que se revelam no lirismo abundante, derramando versos, metáforas e declarações, como se precisassem nomear o sentimento para confirmá-lo. Outros, ao contrário, manifestam-se na contenção. Esse silêncio, longe de ser vazio, constitui-se em espaço de proteção, como observa Bachelard (1988), para quem a intimidade poética não se dá apenas pelo dito, mas também pelo não-dito.
Assim, a relação amorosa pode se organizar em uma assimetria de linguagens: de um lado, aquele que fala, escreve, canta; de outro, aquele que responde por símbolos, sinais breves ou vocativos íntimos. Embora aparentemente desiguais, essas formas de expressão encontram convergência naquilo que comunicam: a permanência do vínculo.
Roland Barthes (1981), em Fragmentos de um discurso amoroso, já destacava que a fala amorosa não é contínua, mas fragmentária: “o discurso amoroso é feito de suspensões, interjeições e fragmentos que resistem à linearidade.” Nesse horizonte, uma curtida, um coração ou uma resposta curta podem ser compreendidos como declarações veladas, dotadas de uma densidade simbólica que escapa ao olhar apressado.
Bauman (2004), por sua vez, ao refletir sobre a fragilidade dos vínculos na modernidade líquida, lembra que a solidez afetiva não depende de demonstrações exuberantes, mas da constância silenciosa que resiste ao tempo. Amar em silêncio, portanto, não é negar o amor, mas afirmá-lo de modo discreto, preservando sua força na sutileza.
Conclui-se, assim, que o amor não necessita de barulho para ser verdadeiro. Entre palavras abundantes e sinais mínimos, existe um espaço de encontro em que a diferença de linguagens se torna complementar. O silêncio deixa de ser ausência e se torna presença velada — uma forma tímida, mas profunda, de dizer: “Eu também estou aqui, eu também sinto.”
Referências
BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1981.
BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.
Fonte: Dolores Flor