“Carimbo Não Protege”
Poemas | Metade Dita, Metade Sentina : Contos. crônicas, cartas, poemas e confissões que talvez fossem suas. | Silvia Dos Santos AlvesPublicado em 27 de Julho de 2025 ás 10h 44min
“Carimbo Não Protege”
Ela foi à delegacia com medo nos olhos,
carregando no peito o grito que não coube em casa.
Preencheu o papel, pediu proteção,
mas o papel não tem braços, nem escudo, nem pressa.
O agressor sorriu — ele conhece o sistema,
sabe que a medida é só tinta sem presença.
Enquanto ela dorme com a luz acesa,
ele ronda, ameaça, e o Estado silencia.
Registro feito, protocolo seguido,
mas quem protege a mulher do descaso?
Quantas ainda vão morrer com medida ativa,
com nome na lista e corpo no laço?
Feminicídio não é tragédia — é rotina.
É o desfecho de um ciclo que ninguém interrompe.
São mulheres sob mira, sob medo, sob luto,
e homens covardes que se escondem atrás do costume.
Ela não quer flores, nem homenagens tardias.
Quer viver. Quer justiça que funcione.
Quer que o papel vire presença,
e que o Estado seja mais que um carimbo no nome.
Livro: Metade Dita, Metade Sentina : Contos. crônicas, cartas, poemas e confissões que talvez fossem suas.