Chão de Memória
Poemas | 2025 - NOVEMBRO - Caminhos da saudade: reflexões e encontros | Rose CorreiaPublicado em 17 de Junho de 2025 ás 12h 23min
Chão de Memória
A estrada era árdua,
pedras soltas sob meus pés,
mas lembro que, descalça,
não sentia dor — só fé.
Ao fundo, um canto de pássaro
dizia, como uma oração:
"Depois da tempestade,
há sempre flor no chão."
Quanto mais eu me aproximava,
mais o coração acelerava,
sussurrando baixinho
que o nosso cantinho
já não morava lá.
Mas eu insisti —
ali eu nasci!
Era quase promessa,
era quase altar.
Queria o vento antigo
roçando minha testa
como a mão da infância
a me acariciar.
Adentrei um pouco adiante
e vi o bastante
do que restava de mim.
Era meu chão, meu lar ausente,
silencioso e resistente
como um retrato em fim.
Lembrei da água no pote de barro,
da roupa no varal dançando no sol,
dos pés sujos de terra vermelha,
e da carroça de rodas de ferro,
que fazia seu som de arrebol.
Lembrei do cheiro do café coado,
do bolo assando no fogão a lenha,
das conversas que o tempo levou,
mas a alma ainda desenha.
Hoje meus olhos chovem por dentro,
como o céu em tarde cinzenta,
e meu rosto se molha
como chuva de agosto que lenta
desce sem pressa
e carrega lembrança.
Meu pedaço de chão, tão ausente,
ainda mora em mim, tão presente.
Mesmo que o tempo tudo transforme,
há raízes que nunca adormecem.
Poesia Lírica Nostálgica. Rose Correia