Corvo Torto
Sendo eu um homem empenado
Tenho a alma perdida
Penada
Tentando um lugar que também seja meu
Fugindo para dentro da solidão do pensamento
Será que existe um outro eu aí fora pensando?
Ou estará imperativamente aqui dentro?
E impiedoso com o outro dele
Que, de qualquer maneira, este não existirá
Coabito este estado de irrealidade com o inequívoco eu
Ponho-me em todos os lugares
Propositadamente
Inconscientemente
Em busca de afeto
Sendo eu um homem empenado
Procuro pela plaina da alma
Na mesma exatidão do universo
Ou seria eu uma caricatura?
E qual será a verdadeira ilusão que não pode ser vivida?
E estou certo e farto de que tal resposta não encontrarei
Apenas o oculto da memória restará
Que me faz o ser desejante de mim
Numa via crucis de minha carne
Tendo eu esta alma retorcida
As existencialidades não me contêm
E que tão pouco a transcendência será um cais
Pois vivo mesmo a vagar
Sou o lar das extremidades
O hiato da minha humanidade
E que por vezes pousa sobre o solo fértil dos desejos
No instante cego das paixões
Vejo ancorar dento de mim
Os veleiros da vulnerabilidade
E que seu zarpar deixe ao menos
Um rastro de potência
Pois sendo eu um ser curvo
Nenhuma estrela me guiará
Sou chegado às nublagens
Suas tormentas fazem arrancar as minhas raízes
E tão logo
Estarei reflorestado de mim
20.05.22