Histórias que Gelavam o Peito
Contos | Metade Dita, Metade Sentina : Contos. crônicas, cartas, poemas e confissões que talvez fossem suas. | Silvia Dos Santos AlvesPublicado em 21 de Maio de 2025 ás 22h 13min
A noite chegava mansa, o vento soprava devagar, e na varanda, os mais velhos começavam suas conversas. Era sempre assim—após a janta, enquanto o café esfriava nas xícaras e o cheiro da terra úmida misturava-se ao farfalhar das folhas.
Eu, curiosa demais para me afastar, ficava por perto, tentando ouvir sem ser notada. Mas logo me arrependia.
“Você lembra daquele homem que desapareceu sem deixar rastro?” dizia um deles, e a conversa tomava um tom sombrio. Eu segurava o fôlego, esperando um detalhe que pudesse acalmar meu coração, mas não havia alívio. Eram histórias de noites escuras, passos no quintal, sombras que nunca deveriam estar ali.
O medo crescia devagar, como se cada palavra alimentasse um frio que subia pela espinha. O pior era quando diziam que certas coisas ainda aconteciam, que o vento carregava segredos e que quem prestasse atenção demais poderia acabar ouvindo algo que não deveria.
Eu tentava afastar os pensamentos, mas naquela hora, cada barulho da noite soava mais alto. O ranger do portão, o coaxar dos sapos, o estalo de um galho no quintal—tudo parecia confirmar que aquelas histórias eram mais reais do que eu gostaria.
Quando finalmente iam dormir, eu ficava ali, enrolada no cobertor, com os olhos fixos no teto, repetindo para mim mesma que eram só palavras, só histórias…
Mas o vento ainda soprava.
E, no silêncio da noite, eu jurava ouvir passos—suaves, hesitantes, como se alguém estivesse ali, mas o medo nunca se despedia por completo. Apenas se acomodava dentro de mim, como uma sombra esquecida à beira da noite.
Livro: FRAGMENTOS DO PASSADO