Coisas Pequenas Que Salvam

Não sei exatamente quando comecei a reparar nas coisas pequenas. Talvez tenha sido depois de um dia difícil, desses em que o mundo parece grande demais e a gente, pequeno demais dentro dele. Foi aí que notei: havia uma flor crescendo na rachadura da calçada.

Ninguém parecia vê-la. As pessoas passavam apressadas, desviando dos buracos, dos outros, de si mesmas. Mas ela estava lá. Pequena, teimosa, bonita. Como quem diz: “eu sei que não é o lugar ideal, mas é o que eu tenho — e vou florescer mesmo assim.”

Desde então, comecei a colecionar delicadezas. Um senhor que segura a porta para alguém que vem longe. Uma criança que oferece metade do biscoito. Um bilhete esquecido num livro da biblioteca: “vai ficar tudo bem”. Um cachorro que abana o rabo para um estranho. Um abraço que dura um segundo a mais do que o necessário.

Essas coisas não mudam o mundo. Mas mudam o dia. E às vezes, mudar o dia de alguém já é o suficiente.

Vivemos tempos duros. As notícias pesam, as relações se desgastam, a pressa engole os detalhes. Mas ainda existem pessoas que falam baixo, que escutam com os olhos, que tocam com cuidado. Gente que não desaprendeu a ser gentil, mesmo quando ninguém está olhando.

E é por isso que sigo acreditando. Porque, no meio do caos, ainda há quem escolha ser flor na rachadura. E isso, por si só, já é um milagre.

 

Livro: Metade Dita, Metade Sentina : Contos. crônicas, cartas, poemas e confissões que talvez fossem suas.

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